O Mapa do Mundo Pessoal<span data-metadata="">

uma explicação da condição do indivíduo no mundo

Edil Carvalho

Postado 1 ano ago

Introdução

   Sempre entendi que um mapa astrológico retrata a condição do indivíduo dentro do mundo e que, a partir dessa condição, é possível falar daquilo que, nele, há de mais singular, próprio e pessoal. Mas sempre entendi isso intuitivamente, através de uma intuição para a qual nunca encontrava palavras, até me deparar com um livro com título bastante intrigante: O Mapa do Mundo Pessoal, escrito pelo filósofo de Julián Marías.

   Muito do que ele diz traduz minha intuição e, por isso, faço das suas palavras as minhas e crio uma longa paráfrase, na expectativa de poder dizer enfim o que é um mapa astrológico e para que ele serve.

A pessoa como projeto a se realizar:

     Para Marías, O mundo é o cenário onde a vida humana transcorre e acontece. Não é, portanto, uma estrutura inerte, mas, sim dinâmica: ele exerce uma pressão sobre mim e, por sua vez, eu exerço uma pressão sobre ele. O verbo estar permite compreender adequadamente esta situação: estou no mundo. Porém, com a condição de evitar toda interpretação estática: estou vivendo, fazendo algo em e com esse mundo, aproveitando as possibilidades que oferece, superando ou evitando suas dificuldades, presentes ao longo da vida.

     Mas neste mundo, segundo Marías, quando o homem faz, faz por e para alguma coisa. E isto lhe exige uma constante justificação. Em nossa época, o utilitarismo, a conveniência, sobretudo econômica, parecem o decisivo, a justificação inteligível e aceitável. Mas por debaixo de toda essa demanda, há uma decisão querendo ser tomada e cujo motor é outro:  a realização de um projeto vital. Isto porque o homem é projetivo, tem propósitos, imagina e antecipa o que vai fazer e ser, diante das resistências ou facilidades que o mundo lhe apresenta. A justificativa essencial para todo e qualquer ato humano adquire, portanto, um máximo de exigência quando parte não de motivações superficiais ou periféricas, mas, sim, do centro ou do núcleo da pessoa. Afinal, é nele que se originam as grandes decisões e o que elas tentam realizar é precisamente o projeto fundamental em que a pessoa consiste.

     Por isso, se pretendemos conhecer aquilo que, no ser humano, há de mais pessoal, temos que reconhecer que, nele, há um núcleo sempre projetivo que procura afirmar-se entre múltiplos obstáculos, tentações, caídas. E se pretendemos conhecer o que há de mais pessoal em um ser humano através do seu mapa astrológico, temos que considerar o seu centro, como diz Marías: o seu núcleo, a partir do qual emanam atos que procuram construir um projeto vital. Neste sentido, um mapa astrológico não descreveria fundamentalmente preocupações de natureza econômica e até mesmo amorosa, mas, sim, algo muito mais profundo e recôndito: o sonho de realização pessoal de um ser humano, aquilo que ele pretende ser. Em outras palavras, o futuro que ele se esforça para tornar possível, neste mundo onde se encontra instalado e que lhe demanda uma série de exigências e de obrigações que acabam por soterrar por completo seu projeto vital.

     Se um mapa astrológico serve para alguma coisa, é para isso: para desenterrar o projeto de realização pessoal.

<span data-metadata=""><span data-buffer="">O mapa do mundo pessoal: Sua importância e urgência

   Deveríamos, ao empregar um mapa astrológico para traçar as características mais próprias e pessoais de um ser humano, reconhecer certas coisas que o filósofo Julián Marías reconhece ao traçar o mapa do mundo pessoal.

     Antes de tudo, reconhecer que essa zona do pessoal corresponde rigorosamente a uma estranhíssima forma de realidade. Afinal, nem todo ser humano se faz presente diante de si mesmo. Aliás, é muito frequente que o homem oculte, até para si mesmo, seus motivos pessoais, recobrindo-se com outros motivos que parecem objetivos e justificáveis, como aqueles determinados por uma época, por um grupo, por uma sociedade. Mas por debaixo dessas motivações, há uma outra de caráter estritamente pessoal, da qual o sujeito quase sempre envergonha.

     Por isso, ao abandonar o terreno cômodo e seguro das coisas, o ser humano entrevê um abismo, uma forma desconhecida de realidade que é precisamente a dele próprio. Não só se tem medo de aventurar-se no problema, mas também medo de viver a partir dessa realidade. Não seria excessivo dizer o que o homem passa a vida defendendo-se da pessoa que é, substituindo-a por alguma coisa diferente, pondo-a entre parênteses, protelando-a. Quando essa fuga se generaliza, a personalidade fica interdita e a vida humana rebaixa de um grau – e esta, como continua explicando Marías, é a forma mais profunda de decadência, porque não é econômica, política ou cultural, mas porque afeta a própria realidade do ser humano como pessoa. 

     É por isso que o reconhecimento e aceitação das importâncias verdadeiras é um fator decisivo na autenticidade das vidas. Não é fácil, porque as pressões exteriores são tão fortes que a clareza se torna improvável, a menos que se tenha notável lucidez e se faça o esforço requerido. E é por isso também que o sucesso biográfico pode ter duas caras: uma, a aparente, que depende das vigências e dos motivos reconhecidos pela família, pelo grupo, pela sociedade; outra, a real e mais profunda que pode não ser clara até mesmo para o próprio interessado, mas que continuará iluminando a sua biografia, com um relevo desproporcionado à importância que se lhe concede.

     Sendo assim, viver pessoalmente só pode significar uma única coisa: acertar as últimas contas consigo mesmo, olhando para o fundo de si próprio. 

   Neste caso, quando o sujeito foge de si mesmo, o mapa astrológico serve para isso: para que ele possa enfim acertar as contas consigo próprio. Mas se ele quer se aventurar no mundo pessoal, o mapa astrológico é outra coisa: a porta de entrada.